Mercado brasileiro do peixe visa protagonismo alimentar na próxima década

Nos próximos dez anos, a procura pela carne de peixe brasileira deve aumentar nos mercados externo e interno, mas para isso terá de superar o tímido consumo doméstico, barreiras ambientais e perdas recentes geradas pela greve dos caminhoneiros, que pelos cálculos da Associação Brasileira da Piscicultura (Peixe BR) afetará “cerca de 2% da taxa de crescimento”.

Além disso, Francisco Medeiros, presidente da associação, prevê que nenhuma proteína animal terá maior taxa de consumo no Brasil quanto a de peixe, e acredita que esse cenário assegurará um papel de destaque para esta proteína no crescimento mundial da demanda por alimentos.

“Do ponto de vista da sustentabilidade, nós estamos melhores. Se você precisa engordar 1 kg de bovino, vai gastar de 6 a 7 kg de ração. Uma ave, 2 kg. O peixe hoje trabalha com 1,2 ou 1,3 kg“, avaliou.

Seja por motivos econômicos ou culturais, os dados de 2013 da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) mostram que o consumo médio de peixe é de 9,7 kg por ano no Brasil, menos da metade dos 19,7 kg anuais do mundo.

Para impulsionar o setor, a Peixe BR lançou recentemente uma nova edição da campanhaSemana do Peixe, que expôs uma perspectiva inesperada.

“O resultado foi também no aumento da importação. É mais fácil comprar um contêiner de peixe do que cavar um tanque pra ter ele daqui a oito meses”, disse Medeiros.

Para mudar este quadro, neste ano a ação se foca nos peixes de cultivo nacionais, como a tilápia, o tambaqui e o pacu, e valorizará os benefícios desta proteína.

“O peixe contém ômega 3 – no caso dos de água salgada e profundas – vitamina D e minerais, como cálcio, zinco, iodo, potássio, sódio e ferro. Seu consumo regular está associado à melhora da memória, prevenção de Alzheimer, de doenças cardiovasculares e de doenças ósseas”, destacou Samantha Caesar de Andrade, doutora em Nutrição em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo (USP).

O otimismo com o futuro se respalda também nos números do anuário estatístico da piscicultura de 2018, produzido pela associação; em 2017, o setor cultivou 691,7 mil toneladas de peixe, um crescimento de 8% em relação a 2016.

Parte disso proveio de investimentos de importantes players, sobretudo no estado do Paraná, líder nacional do setor.

Gustavo Locatelli, piscicultor da Coopacol, cooperativa de Cafelândia (PR), aplicou R$ 1,7 milhão na produção de tilápia – produto líder no território, que responde por 51,7% da produção total de peixe.

“Das pecuárias existentes, a piscicultura é a mais promissora. O mercado (interno) está com peixe em falta, então a tendência é de melhorar. E, em seguida, a tendência é exportar, porque agrega mais valor”, comentou Locatelli.

A oferta interna limitada se manifesta em importações: em 2017, os números foram de US$ 1,318 bilhão; já nas importações, o país faturou pouco menos US$ 150 milhões em 2017 com a venda de peixe para o exterior, sendo os Estados Unidos o principal destino.

Entre 2003 e 2015, o país contou com o Ministério da Pesca para formular políticas e diretrizes no setor. No entanto, a pasta foi extinta e hoje o tema se concentra na Secretaria Especial da Aquicultura e da Pesca (SEAP) da Secretaria-Geral da Presidência da República.

João Crescêncio Aragão Marinho, diretor do Departamento de Planejamento e Ordenamento da Aquicultura da SEAP, afirmou que o Brasil é favorecido por uma imagem internacional favorável e bem reconhecida.

“Um relatório da FAO estima que o Brasil deve registrar um crescimento de 104% na produção da pesca e aquicultura até 2025″, explicou o diretor, que acredita haver “grande oportunidade” de o país se tornar um dos principais fornecedores desta “nobre proteína”.

Mesmo assim, há entraves neste sentido. Para Locatelli, embora a regulação ambiental seja um limitador para o crescimento – posição compartilhada pela Peixe BR -, a expansão deve ser “pensada”.

“Conheço vários produtores que querem investir, mas estão sendo impedidos. Mercado não falta. Há espaço para expandir, mas, segundo órgãos (ambientais), isso vai afetar áreas de preservação. Então essa evolução deve ser cautelosa”, ressaltou.

Fonte: OTÁVIO NADALETO EFE/UOL