Os efeitos da estiagem prolongada estão sendo constatados na faixa litorânea e na produção pesqueira. As áreas de mangue sofrem alterações pela falta d´água dos rios, que já não desaguam no mar, comprometendo a cadeia de produção de peixes, crustáceos e mariscos.
O fenômeno é mais complexo, tanto por afetar a produção pesqueira, como por causar prejuízos à piscicultura e, em consequência, ao abastecimento humano. A proteína fornecida pelo pescado, diante da escassez, se torna proibitiva por causa da especulação com seu preço, sujeito às oscilações da oferta limitada e da procura crescente.
A crise no segmento industrial e artesanal da pesca começou, há décadas, pela lagosta. Depois, o pargo – outrora abundante – tornou-se diminuto. Até a cavala rareou. O peixe sempre foi alimento capaz de equilibrar os preços do abastecimento interno, por sua larga aceitação e pelo valor menor quando comparado com a carne de boi.
A abertura da Avenida Beira-Mar, nos anos 60, possibilitou a instalação do Mercado do Peixe, no final do Mucuripe, e de inúmeros restaurantes voltados para a comercialização de frutos do mar em seus cardápios. Formou-se um ponto gastronômico no fim da Beira-Mar, no qual as casas comerciais se esmeravam na preparação da peixada tradicional de cioba e garoupa, variando com outras receitas típicas de pargo, arabaiana, guaiuba, camarão e lagosta.
Concorreu para a ocupação da Praia do Futuro, também na mesma década, a instalação de restaurantes em barracas de praia. A clientela era atraída por pratos exclusivos de biquara, assada inteira, e pelo caranguejo. Esses estabelecimentos informais ajudaram a fixar os moradores na imensa área de praia.
Os últimos 50 anos se encarregaram de modificar costumes tradicionais, neles incluídos os da cozinha regional, por conta do esforço exagerado de pesca, começando pela lagosta, carro-chefe da pauta de exportações do Ceará. Essas espécies de peixes ameaçados em sua reprodução e desaparecidos, em grande parte, do mercado de consumo, estão sendo importados de outras regiões onde a atividade predomina.
Nesse setor produtivo, o retrocesso continua noutras áreas. Assim, o controle da produção pesqueira está parado desde 2008. Até então, vigorava convênio celebrado entre o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o Ministério da Pesca e Aquicultura e a Fundação Prozee para a realização dessa tarefa.
A paralisação na coleta de informações implicou na caducidade do acordo firmado entre as partes e na interrupção das séries estatísticas. No ano passado, o Ibama tentou retomar o trabalho, dessa vez, em parceria com a Federação dos Pescadores do Ceará. A pesquisa centrada nos municípios com maior potencial de produção foi suspensa.
O Instituto de Ciências do Mar (Labomar) sempre dedicou à pesca regional cuidados especiais na tentativa de evitar o desmonte de uma atividade econômica rendosa e de relevância para o Ceará. As advertências por ela emitidas foram relegadas a segundo plano, enquanto as previsões de declínio se confirmam.
Diante da indiferença, o Laboratório de Ecologia Animal, do Labomar, aponta o diagnóstico para a diminuição gradativa do pescado. É o resultado direto da pesca excessiva e da captura sem observar a reprodução das espécies e o tamanho mínimo. Embora nunca contestada, essa conclusão não despertou até agora ações para reverter o quadro.
Fonte: http://diariodonordeste.globo.com