As novas espécies de peixes do Oceanário ficam enterradas como as flores do jardim

As novas espécies de peixes do Oceanário ficam enterradas como as flores do jardim

Percorrem-se os corredores escuros à procura do novo aquário. É pequeno em tamanho, mas grande o suficiente para atrair a atenção dos visitantes. Os inquilinos dançam na coluna de água, enquanto mantém a cauda, e grande parte do corpo, escondida na areia. São enguias-de-jardim, enterradas na areia como flores que abanam com a brisa.

No fundo do aquário existe uma grande quantidade de areia para que os peixes, que podem chegar aos 40 centímetros de comprimento, se possam enterrar. Podem ficar totalmente enterrados, mas normalmente têm um quarto do corpo de fora – um pouco mais quando se querem alimentar. Deslizam facilmente para cima e para baixo, ziguezagueando o corpo, de um centímetro de diâmetro, à procura do zooplâncton de que se alimentam – animais unicelulares, ovos e larvas.

As enguias-de-jardim são parentes do congro (também chamado de safio). Enquanto os parentes, que podem chegar a ter um metro, se escondem nos buracos das rochas, as enguias-de-jardim fazem um buraco na areia que enchem do muco que lhes cobre a pele. Desta forma, podem mover-se à vontade que as paredes coesas do tubo não desabam.

As duas espécies do Oceanário de Lisboa, enguia-de-jardim-de-bandas-laranjas (Gorgasia preclara) e enguia-de-jardim-de-pintas (Heteroconger hassi), são alimentadas cinco vezes por dia e usam os olhos grandes para localizar as presas, explica ao Observador Raul Gouveia, um dos aquaristas responsáveis por esta instalação. Para que o alimento não assente logo no fundo, foi criado especialmente para este aquário um sistema de circulação da água que mantém o zooplâncton a nadar na coluna de água enquanto as enguias-de-jardim e a gorgônia – parente dos corais – se alimentam. Embora estas espécies sejam típicas dos oceanos Índico e Pacífico, na costa da Madeira também podemos encontrar uma espécie de enguia-de-jardim – a Heteroconger longissimus.

Neste aquário que levou três meses a montar – desde a ideia inicial até ao resultado que agora se pode visitar – é possível encontrar outras espécies: os caracóis que se alimentam das algas que se acumulam nos grãos de areia e no acrílico, uma gorgônia – um animal com aspeto de planta que fica fixo à rocha e abre os ramos para capturar o alimento – e os habitantes das “rochas vivas”, como algas calcárias ou vermes. A ideia era recriar um “ambiente pouco conhecido”, explica o aquarista: a parte mais profunda dos recifes de coral, entre os 15 e os 45 metros, onde predominam os fundos arenosos e escasseiam as rochas.

Pelo espaço disponível espalham-se indivíduos das duas espécies, disputando território como fariam na natureza onde as colônias têm centenas de elementos. Normalmente os buracos distam 10 centímetros uns dos outros, mas na altura do acasalamento o macho aproxima-se para se poder enroscar (literalmente) na fêmea.

Estes peixes de “aparência fora do comum”, como frisa Raul Gouveia, são poucos frequentes em aquários abertos ao público, como o Oceanário. “A revelação de algo surpreendente” foi um dos motivos que levou à escolha desta espécie. Esta “capacidade de surpreender as pessoas” e de as fazer olhar para os oceanos de uma forma diferente é um dos objetivos do Oceanário, explica ao Observador Patrícia Filipe, diretora de Educação e Comunicação. “A missão é sensibilizar as pessoas: aqueles que vêm ao Oceanário e aqueles a que chegamos por outros meios, para que alterem os comportamentos em prol da conservação dos oceanos.”

As exposições são desenhadas para mostrarem a maior diversidade possível: espécies distintas, formas de vida diferentes ou nichos e habitats variados. As espécies com características pouco comuns mostram-se muito atrativas. “Os visitantes ficam arrebatados pelo aquário central, mas não conseguem explorá-lo ao pormenor. Isso fazem-no nos aquários mais pequenos, onde gastam muito tempo a espreitar as curiosidades”, diz Patrícia Filipe.

A bióloga apresenta algumas das espécies que valem a visita: o peixe-lapa-espinhoso que se cola às rochas por uma ventosa na barriga para não ser arrastado pela corrente ou o caranguejo-gigante-do-pacífico, que pode medir 3,8 metros de uma ponta da pata à outra, conhecido no Japão por “comedor de homens mortos”, porque se alimenta dos animais mortos que chegam ao fundo dos oceanos. Patrícia Filipe chama também a atenção para os peixes-palhaço, agora numa instalação maior porque precisam de mais espaço para desenvolverem os comportamentos sociais complexos. A fêmea domina um grupo de machos. Quando ela morre, o macho maior muda de sexo e toma o lugar dela.

Fonte: http://observador.pt